Angústia e esperança - uma interpretação da escatologia manifestada no filme O primeiro dia
Resumo
O filme O primeiro dia, dirigido por Daniela Thomas e Walter Salles, lançado no Brasil em 1999, tematiza a virada de ano que representa a passagem para o novo século. A questão do tempo é tratada de modo constante na obra, sendo as cenas em que aparece o personagem Vovô o sinal mais claro da contagem regressiva na qual a existência humana se insere. As vidas de João e Maria espelham a universalidade dessa submissão ao tempo, que é motivo de angústia nos âmbitos da penúria social e da dor existencial. Apesar desta angústia que perpassa a narrativa, entretanto, de forma paradoxal a esperança se faz presente. O novo vem surgindo, para além das consciências individuais, e ele é simbolizado pelos fogos da festa e pela fala do moribundo que espera contra toda falta de esperança. O tema abordado pela película se presta a uma discussão fecunda a respeito tanto dos elementos escatológicos que assume da herança judaico-cristã ocidental (por exemplo o milenarismo e a simbologia dos números) quanto da atualização que faz da mesma para o contexto contemporâneo (com as figuras do profeta, do destino, e da dinâmica entre uma representação linear do tempo em relação a uma representação cíclica do mesmo). Propõe-se, pois, que esta obra seja compreendida levando-se em conta o fundo religioso com que dialoga.