Religião e secularismo democrático: considerações teóricas a partir dos casos da França e da Inglaterra

Autores

  • Tarcísio Amorim Carvalho UFRJ

Resumo

Na Europa, o debate sobre a questão do papel da religião no espaço público tem se acentuado desde o final do século XX, impulsionado principalmente pelo processo de integração europeia e pela acomodação das comunidades de imigrantes. Em 2004, a polêmica acerca de suas raízes espirituais se tornou evidente no conflito pelas referências cristãs no projeto constitucional europeu. Embora o processo em si tenha malogrado pelo veto francês e holandês, ele reacendeu a crítica à secularização das instituições europeias.

A imigração também tem sido outro foco de reflexões no tema da religião na esfera pública. Em alguns países europeus, principalmente naqueles onde foram efetivadas políticas imperiais, vários eventos demonstram que a partir do final da década de 1980 os conflitos relacionados às minorias religiosas se acentuaram e, dessa forma, o problema da secularização foi acompanhado pelo debate sobre a etnicidade e o multiculturalismo. Na Inglaterra, após um estudante Sikh ter sido impedido de entrar em uma escola por portar um turbante em 1983, a Câmera dos Lords decidiu em favor do aluno, reconhecendo seus direitos étnicorreligiosos. A promulgação da Lei de Reforma do Ensino de 1988 possibilitou a alteração do caráter cristão do culto obrigatório nas escolas públicas a fim de abarcar outros grupos religiosos, e na década de 1990 deu-se início a uma política de financiamento de escolas para diferentes grupos religiosos. Por outro lado, tem-se assistido na França, principalmente a partir da década de 2000, uma retomada do discurso laico sob a bandeira do republicanismo. Apesar de em 1989 uma diretiva do Conselho de Estado ter declarado que o porte do véu islâmico não contrariava o princípio da laicidade, em 2003 o presidente Jacques Chirac reuniu um grupo de intelectuais e políticos para rediscutir a questão. Em seu relatório final, a Comissão Stasi, como ficou conhecida, apresentou a ideia de que a escola deveria favorecer um distanciamento do mundo real para permitir o aprendizado, evitando toda forma de comunitarismo pela proibição dos símbolos religiosos. Apoiado nas reflexões da Comissão Stasi, em março de 2004 o governo francês aprovou uma lei nesse sentido.

Tendo em conta esses fatos, pode-se questionar qual o papel que a religião ainda exerce no imaginário nacional e como as democracias europeias tem se articulado para responder às demandas religiosas. Partindo de concepções comuns de direitos humanos, por que os países europeus endossam diferentes visões de secularismo? Enfatizando os casos da França e da Inglaterra, este artigo demonstra que a questão religiosa no Estado democrático, longe de seguir uma lógica secular universal, varia de acordo arranjos políticos e características nacionais.

Biografia do Autor

Tarcísio Amorim Carvalho, UFRJ

Mestrando em História Comparada e Bolsista Capes. Contribui para o projeto de pesquisa "Multiculturalismo e Novas Identidades: questões teóricas da política contemporânea", vinculado ao Departamento de Ciência Política.    

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Publicado

2012-11-28

Como Citar

Carvalho, T. A. (2012). Religião e secularismo democrático: considerações teóricas a partir dos casos da França e da Inglaterra. Anais Dos Simpósios Da ABHR, 13. Recuperado de https://revistaplura.emnuvens.com.br/anais/article/view/640

Edição

Seção

2012 GT 07: Religião e Modernidade: Interfaces – Coord. Eduardo Gusmão de Quadros