Irmãos de cor e de fé: a herança africana reconstruída através do “parentesco ritual” da Irmandade do Rosário em Vila Rica

Autores

  • Maria Evaristo

Resumo

O papel das Irmandades Religiosas no mundo católico era o de propagação da vida espiritual, dessa maneira, o estudo da religião, na América portuguesa, se torna relevante ao interpretá-la como “uma estrutura orgânica e extremamente dinâmica”, cuja atividade se fazia presente na assistência social que proporcionava segurança apropriada à sociedade. Nomeadamente, na Irmandade do Rosário, foco desta pesquisa, agrupavam-se negros de etnias distintas, cujo encontro gerava uma situação que exigia uma reorganização cultural das várias tradições, no intuito de criar um entendimento que propiciasse a comunicação entre seus membros e a consequente resignificação de elementos culturais específicos perdidos após a desagregação promovida pelo tráfico e pelas dificuldades incutidas pela vida no cativeiro, porquanto, parentes e amigos eram vendidos e separados, desarticulando, assim, a noção de família. Os vínculos constituídos por essa nova família, composta por companheiros de augúrios e pelo convívio religioso grupal, foram de suma importância para o não perecimento no cativeiro e pela “recriação de valores e referências culturais”. Observa-se que o catolicismo manteve seus dogmas, contudo, a influência religiosa negra demonstra seu poder através dessas Irmandades por meio de suas festas, com destaque para o congado, inaugurando uma perspectiva cultural distinta. No entanto, a autoridade monárquica era quem exercia o verdadeiro poder através do controle das Irmandades leigas, provocando uma situação paradoxal entre os interesses religiosos e os civis. Fatores como o ser africano ou crioulo, pardo ou mulato, provocava rivalidade entre os escravos, pois essas divisões eram importantes na escolha de “parceiros ou parceiras” e, principalmente, na aceitação do grupo. Ao se estudar os negros escravos na Bahia, fala-se de uma resemantização da palavra parente, que pode ser agenciada igualmente com relação à Minas Imperial, haja visto que os nascidos na África, sejam escravos ou libertos, tinham grande dificuldade em constituírem famílias, assim sendo, ampliavam o sentido de parente para os que conjugavam da mesma etnia, surgindo, desta forma, o conceito de “parente-nação”. O impacto da dura vida no cativeiro pode ser apreendido pela intensidade com que os escravos construíam relações fictícias ou simbólicas de parentesco, em que essa carência teria sido propícia à penetração das Irmandades, cuja atuação era uma alternativa de “parentesco ritual” que fornecia aos membros mais que um espaço de comunhão e identidade, uma vez que estavam prontas a ajudar nos momentos de necessidade, na conquista da alforria, protestando contra abusos senhoriais e oferecendo dignos rituais fúnebres.

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Publicado

2012-11-14

Como Citar

Evaristo, M. (2012). Irmãos de cor e de fé: a herança africana reconstruída através do “parentesco ritual” da Irmandade do Rosário em Vila Rica. Anais Dos Simpósios Da ABHR, 13. Recuperado de https://revistaplura.emnuvens.com.br/anais/article/view/515

Edição

Seção

2012 GT 04: Religião, Religiosidade e Poder no Brasil Imperial – Coord. Ítalo Santirocchi