Crimes, lugares e devoções: o campo religioso não oficial no Seridó Potiguar

Autores

  • Lourival Andrade

Resumo

A região do Seridó Potiguar é carregada de significações religiosas que fazem das práticas dos devotos emergir uma rica demonstração de gestos e sensibilidades que reforçam uma religiosidade que foge do controle canônico e que faz de seu mosaico devocional um campo de pesquisa com enormes possibilidades de análise. Entre estas práticas está a devoção a alguns "santos" não canonizados e que sofreram crimes violentos. Buscar nestes crimes os ganchos e os indícios que levam pessoas a transformar pessoas comuns, ou quase, em mortos poderosos que podem influenciar no destino dos vivos é um dos objetivos deste trabalho. O Brasil está repleto destes milagreiros de cemitério, mas em cada lugar há suas especificidades. É neste contexto que os túmulos tornam-se também espaços de sacralidade e de encontro do devoto com seu “morto” santo. Não mais apenas os santos canonizados passam a fazer parte do panteão de milagreiros, mas também pessoas que de alguma forma tornaram-se santificados conforme a vontade e desejo de seus fiéis. O cemitério e mais precisamente o local de sepultamento passa a ser um lugar para a pesquisa histórica que se debruça sobre as religiosidades não oficias. Práticas significativas e sensibilidades são observadas nestes locais de devoção, ritos e gestos se tornam perceptíveis, tanto no túmulo como nos locais onde o “santificado” teve sua morte, na maioria das vezes, trágica. Este trabalho examinará as relações entre crimes que ocorreram na região do Seridó Potiguar e onde os mortos, conforme seus devotos passaram a operar milagres. Dois serão os casos: Dr. Carlindo de Souza Dantas (28/10/1967 – Caicó) e José Leão (20/01/1887 – Florânia). O primeiro assassinado a tiros em frente ao Caicó Esporte Clube, um ano depois de o morto ter sido absolvido de um crime. Hoje seu túmulo está repleto de ex-votos e de pedidos para que ele conceda graças e milagres a seus devotos. O segundo assassinato se deu em uma fazenda e o morto além de ter sido assassinado, foi esquartejado e queimado. No lugar do crime está uma cruz e uma capela, onde devotos da região e até de outros estados acorrem para pedir e agradecer pela intercessão de Zé Leão. Este crime criou ao longo dos anos um termo pejorativo a cidade de Florânia, que passou a ser conhecida como a “terra que mata e queima”. Dois crimes e duas devoções. Porque outros crimes, tão bárbaros como estes, não fizeram de seus mortos, milagreiros populares? Quais os elementos constitutivos da santificação e da sacralização de lugares? Mergulhar neste universo devocional é um dos grandes desafios da história que busca na religiosidade não oficial as identidades dos “Brasis” e dos “Seridós”.

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Publicado

2012-11-15

Como Citar

Andrade, L. (2012). Crimes, lugares e devoções: o campo religioso não oficial no Seridó Potiguar. Anais Dos Simpósios Da ABHR, 13. Recuperado de https://revistaplura.emnuvens.com.br/anais/article/view/416

Edição

Seção

2012 GT 23: Festas, ritos e devoções em lugares sagrados – Coords. Edilece Couto, Janio de Castro